Uma das premissas que sustentam o discurso da esquerda é a ideia de que os pobres devem votar nela, já que supostamente seus interesses são melhor representados por esse espectro político. No entanto, essa visão simplista não apenas subestima a capacidade de julgamento dos eleitores, mas também coloca em xeque princípios éticos fundamentais. Quando se assume que alguém de classe social menos favorecida deve, obrigatoriamente, votar na esquerda em razão de seu “interesse próprio”, o discurso se torna perigoso, ao igualar moralidade e justiça a um interesse material egoísta.
A ideia de que o pobre deve, sem questionar, apoiar a esquerda por se beneficiar diretamente dessa escolha ignora um aspecto crucial: a política não se resume a interesses materiais imediatos. Justiça e moralidade não podem ser reduzidas a quem oferece mais vantagens econômicas. Um exemplo esclarecedor seria imaginar um pobre que tenha a oportunidade de roubar a carteira de um vizinho mais rico sem ser descoberto. De acordo com a lógica simplista do interesse pessoal, esse roubo seria justificável, pois aumentaria o bem-estar do ladrão à custa do outro. Mas, ao aplicar um senso mais elevado de moralidade, percebemos que o ato de roubar é condenável independentemente dos benefícios imediatos. O mesmo raciocínio se aplica ao voto.
A equação da justiça com o interesse próprio: uma distorção perigosa
Equiparar justiça ao interesse pessoal, como faz o discurso de que os pobres devem votar à esquerda por se beneficiarem disso, é uma distorção. Quando um pobre se recusa a votar na esquerda por considerar que redistribuir a riqueza de maneira coercitiva, através do estado, é injusto, ele não está sendo “tolo” ou “alienado”. Ele está agindo com base em princípios morais mais elevados, considerando a justiça como algo que transcende seus próprios interesses materiais. Não se trata de ignorância, mas de uma decisão consciente de colocar a ética acima da conveniência.
Para a esquerda, essa decisão pode parecer uma traição à própria “classe”. No entanto, uma pessoa que decide votar com base em convicções morais e não no que lhe traz mais vantagens materiais está, na verdade, contribuindo para uma sociedade mais íntegra. Afinal, uma democracia saudável depende da convivência entre pessoas que não buscam apenas o benefício próprio, mas que se guiam por princípios de justiça e equidade.
A moralidade e a integridade como pilares da escolha política
A integridade, no entanto, não é um conceito facilmente digerido pelos que defendem uma visão puramente materialista da política. O pobre que vota contra políticas de esbulho estatal, que poderiam lhe beneficiar no curto prazo, não está rejeitando uma oportunidade de melhoria pessoal, mas sim optando por uma visão de justiça que não compactua com a coerção ou a exploração de terceiros. Ele está escolhendo ser honesto e justo em sua conduta, não por ingenuidade ou falsa consciência, mas porque acredita em princípios que transcendem os ganhos momentâneos.
Por outro lado, a insistência da esquerda em rotular como “alienados” ou “enganados” aqueles que não seguem seu caminho político reflete uma falha em sua própria narrativa. Ao invés de reconhecer a autonomia moral dos eleitores, a esquerda muitas vezes recorre ao desdém e à crítica, sugerindo que apenas quem apoia suas ideias está agindo corretamente. Essa postura revela mais sobre quem desdenha do que sobre quem é desdenhado. Afinal, o desprezo por aqueles que pensam diferente mostra uma incapacidade de entender que a política também é feita de princípios e não apenas de benefícios imediatos.
A falha em persuadir e o desprezo pelos que discordam
Se a esquerda realmente acredita na superioridade de suas ideias, deveria tentar persuadir os eleitores com base em argumentos racionais e valores compartilhados, em vez de ridicularizar aqueles que optam por não votar nela. O fracasso em persuadir não é uma falha do eleitorado, mas uma falha do próprio discurso da esquerda. Quando um grupo político se recusa a debater de forma honesta e justa, preferindo o caminho da crítica e do ataque moral, ele revela sua própria fragilidade.
Condenar os pobres que não votam à esquerda é, em última análise, uma forma de ignorar que o voto é uma expressão de convicções pessoais. Nem sempre o que parece ser o “interesse material imediato” é o que de fato move o eleitor. A política deve, antes de mais nada, respeitar a integridade das escolhas feitas com base em princípios morais. A capacidade de um eleitor, pobre ou rico, de votar por algo que considera justo, e não apenas por interesse próprio, deve ser vista como um ato de coragem e integridade, e não como um “erro” que precisa ser corrigido.